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    [Fósforo em sistemas agroflorestais: uma contribuição para a agricultura sustentável na Zona da Mata de Minas Gerais, Brasil]
    (2002) Cardoso, Irene Maria; Oenema, Oene
    A Zona da Mata está situada no domínio morfoclimático da Mata Atlântica, na região sudeste de Minas Gerais, Brasil. Este domínio acompanha a costa brasileira de norte a sul e está entre os cinco dos 25 "pontos quentes" da biodiversidade, que são as áreas de maior biodiversidade vegetal e animal e mais ameaçadas do planeta. Originalmente a Zona da Mata era coberta por florestas, restando atualmente cerca de 7.5 % da cobertura original. Os agroecosistemas que se instalaram na região apresentam produtividade decrescente devido à intensificação do uso do solo, utilizando muitas vezes manejo inadequado. Em 1993, agricultores e pesquisadores, buscando alternativas agrícolas mais sustentáveis iniciaram a implementação (ou melhoria) de sistemas agroflorestais com café (cultura de maior valor econômico) na região, acompanhando a vocação natural daquele ambiente, originalmente florestado. Os principais objetivos da implantação de sistemas agroflorestais foram: 1) regeneração e conservação dos solos; 2) diminuição do uso de insumos externos na agricultura; 3) aumento ou manutenção dos níveis de produção; e 4) melhoria da produtividade. É condição necessária para atingir esses objetivos, a melhor compreensão da ciclagem de nutrientes no solo. O presente trabalho objetivou contribuir para melhorar a compreensão desse aspecto, com ênfase no fósforo (P), por se tratar de um nutriente essencial de baixa disponibilidade na maioria dos ecossistemas e que nos solos tropicais, altamente intemperizados, se constitui no principal limitante da produção agrícola. A deficiência em P é causada principalmente pela forte adsorção do H2PO4- pelos (hidr)óxidos de alumínio (Al) e ferro (Fe), os quais indisponibilizam grande parte do P total para as plantas, principalmente para as plantas cultivadas. A principal estratégia para lidar com o problema da fixação de P nos trópicos tem sido a adição de fertilizantes. Entretanto, é sabido que as reservas minerais de P, necessárias para a produção de fertilizantes, são limitadas e têm previsão de se esgotar em torno de 100 anos, mantido o atual crescimento do uso de P. Nesse contexto, é necessário o desenvolvimento de estratégias sustentáveis de uso tanto do fertilizante fosfatado aplicado, como do P nativo do solo. Uma dessas estratégias consiste de sistemas agroflorestais. A nossa principal hipótese de trabalho foi de que os sistemas agroflorestais tornam disponível parte do P inorgânico (Pi) presente nos solos, outrora não disponível para as culturas. Isto ocorre devido a diferentes mecanismos, onde se destacam: a) as raízes de algumas árvores podem explorar um volume maior de solo em relação às raízes das culturas; b) as associações entre raízes e microorganismos, incluindo micorrizas podem acontecer de forma diferente nas árvores incorporadas nos sistemas agroflorestais e; c) a rizosfera destas árvores podem apresentar características distintas, devido a liberação de diferentes exsudados, tais como ácidos orgânicos e fosfatases. As questões centrais da presente pesquisa foram: 1. Os sistemas agroflorestais modificam a dinâmica de P no solo? 2. Estas modificações acontecem em profundidade? 3. As espécies arbóreas usadas nos sistemas agroflorestais aumentam a ciclagem de P, liberando P que não estaria disponível às culturas? 4. Como tais processos ocorrem? Para responder a essas questões, foram selecionadas áreas de cafezais em sistemas agroflorestais e convencionais (pleno sol e em monocultura) da Zona da Mata de Minas Gerais, onde foram coletados solos em diferentes profundidades. Foram estudados alguns mecanismos envolvidos na melhoria da ciclagem de P nos solos. O capítulo 1 apresenta a descrição do problema, a abordagem escolhida. a caracterização da área estudada e os principais passos da pesquisa. No capítulo 2 são descritos os processos participativos e os métodos usados para implantar e monitorar os sistemas agroflorestais na Zona da Mata, assim como são discutidas algumas das vantagens e desvantagens encontradas durante os cinco primeiros anos de implantação destes sistemas. É também mostrado no capítulo 2 que durante os processos participativos de avaliação e monitoramento desses sistemas agroflorestais, os agricultores solicitaram mais pesquisas acadêmicas em qualidade do solo e reciclagem de nutrientes, suscitando as questões apresentadas nessa tese. Os três próximos capítulos (3, 4 e 5) caracterizam o solo dos sistemas agroflorestais e convencionais, em diferentes profundidades, quanto aos compartimentos ("pools") de P orgânico e inorgânico (capítulo 3), tipo de compostos de P (capítulo 4) e atividade de micorrizas (capítulo 5). O primeiro passo no estudo da dinâmica do P no solo é estimar os vários compartimentos de P, o que normalmente é feito por fracionamento químico. Assim, o capítulo 3 mostra as diferenças entre os sistemas agroflorestais e convencionais a partir dos procedimentos de fracionamento de P. A quantidade de P orgânico (Po) diminuiu menos em profundidade (efeito de profundidade na soma de Po) e a percentagem de Po em relação ao compartimento lábil foi maior (efeito de sistema na soma Po : lábil) nos sistemas agroflorestais em comparação com os convencionais. No capítulo 4 usou-se 31PRNM (fósforo 31 Ressonância Nuclear Magnética) para avaliar os compostos de P inorgânico e orgânico presentes nos solos. Os resultados encontrados no capítulo 4 confirmam e ampliam os resultados apresentados no capítulo anterior. Encontrou-se que a taxa de Po em relação ao P total e também de diester (composto orgânico considerado lábil) em relação ao P total são maiores nos sistemas agroflorestais do que nos convencionais de café. Houve também efeito de profundidade: os sistemas agroflorestais comparados aos sistemas convencionais mostraram maior taxa de Po:P total em profundidade. Além disso, a quantidade de diester e a taxa diester:monoester (composto orgânico considerado menos lábil) decresceram menos em profundidade nos sistemas agroflorestais do que nos sistemas convencionais. Estes resultados corroboram a hipótese de que os sistemas agroflorestais influenciam a dinâmica do P devido a conversão de parte do Pi em Po, o que é provavelmente conseqüência da maior atividade biológica nos sistemas agroflorestais. Porque aparentemente o Po é fixado mais lentamente do que o Pi e porque a atividade biológica no solo recicla em formas mais jovens, mais lábil, compartimentos de P, os sistemas agroflorestais manteriam maiores quantidades de P disponíveis às culturas e reduziriam perdas de P para compartimentos menos lábeis. No capítulo 5 reportou-se a presença de maior número de esporos de micorrizas arbuscular (MA) em maiores profundidades nos solos dos sistemas agroflorestais em relação aos sistemas convencionais, o que pode ser um indicador de maior incidência de micorrizas naqueles. Isso provavelmente se deve a presença de mais raízes em profundidade nos sistemas agroflorestais em relação aos sistemas convencionais (efeito de profundidade). A maior atividade de micorrizas em maiores profundidades pode aumentar a ciclagem de P em profundidade mudando então a dinâmica do P nos solos, por exemplo, promovendo diferenças na distribuição de P entre os vários compartimentos (capítulos 3 e 4). Os efeitos nos sistemas agroflorestais, principalmente em profundidade, encontrados no capítulo 5 estão de acordo com o resultados obtidos nos capítulos 3 e 4. Nos dois próximos capítulos (capítulos 6 e 7) estudou-se mecanismos utilizados pelas plantas na convivência com baixa disponibilidade de P em solos ácidos. No capítulo 6 são apresentados os resultados dos estudos utilizando-se uma variedade de milho resistente a toxidez de Al (CMS 36) e sua associação com micorrizas. No experimento descrito no capitulo 6 é apresentada uma nova metodologia a de "vaso duplo-compartimento duplo", na qual associaram-se as metodologias do "vaso-duplo", normalmente usada em experimentos de nutrição de plantas, e do "compartimento-duplo", normalmente usada em experimentos com micorrizas. Nesse experimento, as plantas micorrizadas cresceram melhor em solos ácidos do que as plantas não micorrizadas. As plantas micorrizadas exauriram as formas consideradas prontamente lábeis de P (Resina e NaHCO3-Pi) e usaram em torno de 20% da forma considerada moderadamente lábil (NaOH-Pi). As plantas não micorrizadas, por sua vez, fracassaram completamente em adquirir P mesmo dos compartimentos mais lábeis. É normalmente aceito na literatura que plantas micorrizadas e não micorrizadas usam P das mesmas fontes, mas que plantas micorrizadas exploram um volume maior de solo do que as plantas não micorrizadas. Embora controvertido, tem sido também sugerido que micorrizas podem utilizar P de fontes menos lábeis, não utilizadas pelas raízes de plantas sem associações com micorrizas. No experimento apresentado no capítulo 6, mostrou-se que as micorrizas foram além de só aumentar o volume de solo explorado pelas raízes. Mostrou também que a metodologia do "pote duplo-compartimento duplo" é adequada para estudos de nutrição de plantas envolvendo micorrizas. O capítulo 7 apresentou um resumo do capítulo 6, porém enfatizou que mecanismos de resistência ao Al e aquisição de P de solos com alta toxidez de Al não são necessariamente relacionados, contrário do que é comumente aceito na literatura. A resistência ao Al foi provavelmente devido a produção de ácido cítrico pela variedade de milho. Conhecimentos atuais sugerem Que tal mecanismo também facilita aquisição de P em solos ácidos. No entanto as raízes da variedade de milho resistente ao Al fracassaram completamente em adquirir P do solo na ausência de micorrizas, mesmo das fontes prontamente lábeis (Resina e NaHC0,-Pi). Conseqüentemente, mecanismos de resistência ao Al e de convivência em ambientes de baixa disponibilidade de P parecem não estar necessariamente interligados como sugerido na literatura. Se para a variedade de milho utilizada o ácido cítrico foi importante na resistência ao Al, ele não foi importante na aquisição de P. No capítulo 8 o modelo desenvolvido (baseado no modelo DYNAMITE) como exercício para estudar ciclagem de P, confirmou qualitativamente os resultados do capítulo 3 de que a taxa de Po em relação ao P lábil é maior nos sistemas agroflorestais do que nos sistemas convencionais. O exercício foi útil para integrar informações. A necessidade de se obter informações mais claras, principalmente aquelas que se referem ao papel dos microorganismos no fluxo de P entre os compartimentos, também vieram à tona. Os resultados do fracionamento de P no solo (latossolo) usado no experimento da casa de vegetação (capitulo 6), confirmaram os resultados do fracionamento do P em solos (também latossolo) coletados nos sistemas agroflorestais e convencionais (capítulo 3): o P total do solo usado na casa de vegetação (horizontes A e B) não foi muito baixo, entretanto, em média 70% do P estava nas frações extraídas com HCl concentrado e no resíduo, as quais são consideradas não disponíveis para as culturas no curto prazo (uma estação de cultivo) ou médio prazo (mais de uma estação de cultivo); e a segunda maior fração foi a NaOH-Pi (em média 25%), tal fração é considerada disponível no médio prazo. A difusão é o principal mecanismo de transporte do P no solo. Assim, no longo prazo, as micorrizas (capítulo 6) podem alterar a distribuição de P entre os diversos compartimentos devido ao uso do NaOH-Pi e de frações mais lábeis (Resina-Pi e NaHCO3-Pi). Portanto, se árvores podem mudar a performance das micorrizas nos sistemas agroflorestais comparada aos sistemas convencionais, por exemplo, aumentando a atividade de micorrizas em profundidades (presença de mais esporos, capítulo 5), espera-se que ocorra uma mudança na dinâmica de P tornando-o mais disponível às plantas. Isto aumentaria a eficiência dos processos de ciclagem de nutrientes nos sistemas agroflorestais. A taxa e o impacto destas mudanças na ciclagem de P e a eficiência de P usado pelas culturas ao longo prazo necessitam ser melhores entendidas e pesquisadas para uma melhor compreensão da importância dos sistemas agroflorestais na utilização do P do solo. Alguns métodos usados nesta tese (fracionamento de P, 31PRNM analysis) são muito estáticos para o estudo da dinâmica do P e são insuficientes para traçar conclusões finais a respeito das transformações ocorridas pelas formas de P do solo. Número de esporos (capítulo 5) é somente um indicador da presença de micorrizas. Mecanismos de aquisição de P devem ser entendidos não somente em plantas cultivadas (milho por exemplo, capítulos 6 e 7) mas também em árvores nativas usadas nos sistemas agroflorestais, tais como as árvores listadas nos capítulos 2 e 5. Assim, estudos mais detalhados são necessários para um melhor entendimento das transformações sofridas pelas formas de P do solo devido a ação microbiana. Os resultados destes estudos podem ser incorporados no modelo apresentado no capítulo 8 para melhorá-lo. Os estudos aqui apresentados formam um ponto de partida para o entendimento da dinâmica de P nos sistemas agroflorestais da Zona da Mata de Minas Gerais. A demanda dos agricultores para maiores esclarecimentos sobre dinâmica de nutrientes (capítulo 2) ainda não pode ser respondida completamente. Para tal, estudos de P devem ser integrados às atividades de desenvolvimento agrícola que estão sendo realizadas por diferentes atores na Zona da Mata: agricultores, CTA (Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata) e UFV (Universidade Federal de Viçosa), dentre outros. Na discussão geral (capítulo 9 ) foram apresentadas algumas das pesquisas em sistemas agroflorestais que tem sido realizadas na Zona da Mata, e uma moldura geral para futuras pesquisas em ciclagem de P nesses sistemas as quais podem ser expandidas para outras regiões da Mata Atlântica.